sábado, outubro 05, 2013

Acácio ("Pseudónimos ou Alteregos")


Vem no jornal
Outono chegará quente
Lá longe os tempos vão
Em que as estações eram quatro
Do inverno ao verão
Agora não,
Agora não rimam minha gente

Mas têm as flores
Perdi as datas, as estações
Mas lembro as cores
As regatas, as orações
Cabeça de velho, escaça lucidez
Tão pouco faz sentido mais
Pouca memória
Só lembra a história
Velha de uns tempos atrás

Ah eram as rosas
Lembro-me bem
Milhares delas
Mais de cem
São dez do mar
Oito ao redor
Sem te amar
Sei-te de cor
Fazia poemas
Eram de amor

Já não recordo, nem dela.
Mas que mentira
A quem engano?
Teu perfume caxemira
Teu lençol feito de pano
Sou velho poeta
Não tenho idade
As cartas escritas a caneta
E em cada letra a saudade

Mas sou carcassa, homem pó
Capaz de amar a uma mulher só
Ela jaz aqui, não mais porém
Partiu da terra e foi além
Não mais a vi, perdi-lhe o rasto
Fiquei sozinho neste pasto
Sinto-lhe o aroma, todo o sabor
Quando esfria ou faz calor
Vem com o brilho ou a brisa do ar
Com um sorriso vem-me avisar
Que está na hora de partir
Mas tolo sou, não a deixo ir
Pois não se vive sem o amor
Então eu mesmo tratarei da minha dor

Aqui jacente, Acácio
O velho poeta da flor.

domingo, setembro 08, 2013

Penejando


Tenho apenas 34 minutos antes da ausência
Com ou sem retorno
Nem caso ou por descaso se sabe
Não é relevante, vamos faze-lo
Apenas

A sensação é vaga
O sentimento ostenta
Contar estórias não basta
Quando o coração rebenta

Foram mil e uma reticências perdidas
Formas de amor, de amar
A mesma prosa, a mesma rosa, a mesma arte
Cuj'alma a ciência não explica

Um velho louco
Dizem as vozes
O drama da dama
Discursam olhares
A ociosidade dos púberes
Aclamam as bocas
De tudo se palpitava
Embora nada se conviesse

De muito se fala
Quando pouco se diz
Se tolo engana
Ou sábio juiz
Mesmo que sentido não faça
Talvez sentido se mostre

Ousadia pensar
Ser entendivel, ser-se cuidado
Não causa a todos o mesmo efeito
Nem a cada um cai o mesmo feito
E compreensão torna-se antónimo
Sinónimo apenas aos que entenderão

E ainda restam 18 minutos
Se não couber em palavras
Deslindarei em gestos
Todo o resto ou do tanto que faltar

Então, ceifa-se o tempo
Quando se pensa demais
O que antes era longo
Torna-se perda, efémero
Não, não, não é isso
Somente se some, lá fora, o tempo, a urgência
Mas não por dentro
Isso ficou

E cerram-se os olhos
Encerram-se as portas
Calam-se as vozes
Escutam-se os passos
Lá longe
Como em uma peça de teatro
Porque o compasso desse ato
Já foi

sexta-feira, abril 12, 2013

Contando ou Cantando Histórias

" Quantos poemas
Consegue guardar
Uma caixinha?

Quantas palavras
Toldadas de significado
Podem fazer a diferença?

Quantas lágrimas
Precisam ser jorradas
Para se ver além dos olhos?

Quantos sorrisos
Precisam vir escancarados
Para serem somente: notados?

Quantos de nós
Têm um sonho
Que nunca deixam de sonhar? "

(…)

– Pai, e as princesas?!
– Que tem elas pequena?!
– Quando vão aparecer nessa história?!
– É um poema, querida… quem sabe escrito por uma.
– É bonito. E quando entram?!
– Já entraram, aliás, fazem parte dele.
– E como se chamam?!
– Mãe.

quinta-feira, outubro 18, 2012

Um poeta de páginas rasgadas

Sou Machado, sou Pessoa
Ou até um pouco de Camões
Sou mendigo atordoado
Em meio a tantas confusões

Não sou nada, tão pouco um tudo
Sou sem morada, um surdo-mudo!
Talvez cego ou apenas triste
Mas não nego que alguma esperança
Ainda existe!

E assim rumo, remo, rezo
Não desisto!
Emaranhado, ostentado, ostracizado
Eu reinvisto

Levo à proa o eufemismo
Largo em mar as pesses más
Laço em mim o otimismo
Lanço a ti algo voraz

E voo ou nado ou corro
Pela chuva, contra o vento
Cesso mas não morro
Hei-de encontrar-me, algures no tempo...

sábado, outubro 13, 2012

Se a lucidez fosse cura não doeria o tempo inteiro e vender-se-ia na farmácia

Os espelhos estão quebrados e nos cacos ainda se vêm reflexos. Nas paredes talhadas de carcteres antigos ainda se vêm marcas do passado e umas quantas sombras presentes. Os móveis rossados que nunca mudam de lugar são feitos de compartimentos, divisórias e prateleiras que os mantém minimamente atrativos. No começo já foram de um lustro que brilhava naquele interior, hoje são só pedaços gastos de um material que já não se produz mais. Teria uma certa graça se estivesse a falar de museus, mas não. E não estou com a menor vontade de me rir, não forces, não tentes provocar algo que só vai sair em estado líquido. Eu cansei, me cansei – e não me digas que é só mais um estado depressivo qualquer, tu, que tão pouco entendes de psicologia quem dirá de sentimento – mas eu cansei, de tudo, de mim. Sempre tenho que engolir sem resmungar, abrir a boca com cautela policiando e escolhendo cada palavra, já os outros não – podem inclusive usar de eufemismos para me atingir que tudo vai soar com uma certa piada – mas chega! Basta! Eu não quero falar de ninguém, citar nomes tão pouco, na verdade, eu só queria não sentir, isso mesmo, não sentir. Por-que-raios eu tenho que olhar e fingir que não vejo, sentir dor e disfarçar, conter-me se os outros têm a liberdade e o direito de extravasar como querem e bem entendem?! Estou a sufocar com tantas perguntas praticamente retóricas, com tantas questões que tenho guardadas, caladas, pois dar-lhes voz seria desastroso. Perco o raciocínio. Chove tanto. Tenho ouvido tanta coisa, sentido uma porção maior ainda e recebido – bom – recebido uma parte pequena, menor. E os meus olhos, dizem tudo, entregam-me, até no escuro e ainda assim são poucos ou nenhuns os que conseguem ler, ainda que subestimem conhecer-me bem, mas não, nada. Respiro fundo como se o ar tivesse o poder curativo de um bálsamo. Mas nada acalma ou reduz, só me aprisiona como a areia movediça, nesses jogos clandestinos que as pessoas teimam em participar. Não reluz. Não combina. Só mais um pouco de dolências. Perco as forças e largo tudo, viro as costas ao mundo, e pelo menos por breves segundos, aquele momento é só meu, só meu e das minhas efémeras, inatas ou constantes gotas salgadas saídas de dentro das minhas jaboticabas. – Pensei num jeito, num sentido ou num nome até que fizesse par às minhas palavras e angústias, mas nada serviu, nada coube. Ainda que não entendam, também não procuro colos compreensivos, não mais. Apenas verto-me sobre as letras derramadas. E quem foi que disse que não existe sanidade na loucura, ou vice-versa.

quarta-feira, setembro 26, 2012

Pingar sentidos


Para quê esse drama, meu bem
Não uses tensões como desculpa
Não te camufles com esses exageros
Não te coibas de sentir mas não te prives do sorriso
Nem tudo é mau, não o tempo todo

Enroscada no cobertor, cansada
Das salgadas dores que lhe escorriam dos olhos
Lembrei-lhe quão doce pode ser a vida,
Sem extremos ou hipérboles

Um banho, um jato quente
Talvez lhe reaqueça o coração
Misturada à água, pode chorar sem culpas
Sem medo que outros olhos a vejam
Senão os seus
Que miram o reflexo acabado no espelho

E os pés descalços sobre a tijoleira fria
Causam-lhe desconforto, quase um choque térmico
Diz ela! Mas relevo-lhe de novo os aumentos
Conheço-lhe os astros, o signo, o âmago

Talvez seja a hora de trazer-lhe aconchego
Recordo-lhe a sua paixão pela chuva, o seu gosto a maresia
O sabor dos refogados ou o arrepio das brisas, dos ventos
Sei do que gosta, e até do que sente…

sexta-feira, setembro 21, 2012

Agora eu vou dormir

Agora eu vou dormir
Com tuas palavras gravadas em mim
Com as melodias que embalamos nossos ouvidos
Com o abraço desejado e cravado no melhor dos sonhos
Com as lembranças de um passado presente em um futuro próximo
Com você

Agora eu vou dormir,
Meu amor
Já fui, estou indo, não vês?
Meu amor
Tudo me traz você,
Até os sonhos,
E tu, o mais lindo de todos

Agora eu vou dormir,
De verdade
Meus olhos cochilam a cada pestanejar
Então eu vou dormir,
Embora não saiba mais viver longe de ti
Mas eu vou dormir, meu amor
E eu volto amanhã, prometo,
Te amo.